À semelhança da grande maioria da Doçaria conventual portuguesa, crê-se que também a Barriga de Freira de Anadia tenha tido a sua origem no seio religioso, mais concretamente, no Convento de Santa Ursula, mandado construir por senhoras devotas no início do século XVIII, a conselho dos seus padres e confessores jesuítas.
Terá sido, pois, no Convento das Ursulinas de Vale da Mó que estas meninas nobres tornadas freiras aprimoraram receitas trazidas das suas ricas casas e criaram a Barriga de Freira.
A riqueza do doce explica-se também pela origem social das freiras deste Convento. A maior parte das freiras eram oriundas de casas abastadas e iam para os conventos não por devoção, mas por não terem dote, nem património, uma vez que as heranças iam para os primogénitos e às meninas nobres não restava outra solução senão a clausura do convento.
Terá sido, pois, no Convento das Ursulinas de Vale da Mó que estas meninas nobres tornadas freiras aprimoraram receitas trazidas das suas ricas casas e criaram a Barriga de Freira. Estes doces eram, não só a fonte do seus sustento, mas também uma das formas de pagamento aos poetas que se acercavam do Convento para declamar poemas de sedução às freiras.
Com a extinção das ordens religiosas em 1834, as freiras do convento de Vale da Mó foram encaminhadas para o Mosteiro de Sant’Ana, em Coimbra, aí tendo perpetuado a tradição doceira iniciada com a Ordem das Ursulinas, naquela aldeia de Anadia. O segredo, esse terá transposto as paredes do convento para as casas mais ricas de Anadia e chegou aos nossos dias devotamente guardado, pois, às freiras era pedido segredo sobre a confecção dos mais preciosos doces.
Contudo, nas últimas décadas, a mais fiel discípula das grandes doceiras conventuais terá sido, em Anadia, Maria Generosa que, pacientemente, levou este doce ao pináculo perfeccionista. E, durante muitos anos, adoçou as bocas dos seus clientes no restaurante que comandou até há um par de meses. A dedicação trouxeram-lhe vários prémios em concursos de doçaria e, mais recentemente, viu a sua carreira de exímia doceira premiada pela Confraria dos Enófilos da Bairrada que a entronizaram Confreira de Mérito, numa cerimónia realizada no Palace Hotel do Bussaco. Agora, já com oito décadas de vida, Maria Generosa entregou os comandos do seu restaurante a Carlos Fernandes que trouxe um toque de modernidade ao “Quatro Estações”, mantendo, no entanto, a base dos grandes pratos. No que toca à Barriga de Freira, soube também transmitir o legado que passou de mão em mão quase secretamente ao longo dos últimos três séculos, confiando na garbosa Tina Dias o segredo deste doce quer transmite geracionalmente, mantendo a sua alma. Na “Quatro Estações” a tradição não caiu no esquecimento e a Barriga de Freira mantém o seu esplendor conventual.
“As que saem do convento rezam a Deus para não caírem na tentação de o revelar e as que entravam rezam para os fazerem bem.”